Visual Law como meio para Privacy by Design

"Privacy by Design" propõe que a privacidade se torne um pilar organizacional das empresas, estando presente em todas as etapas de desenvolvimento de produtos e serviços.

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A sociedade vem se transformando de maneira cada vez mais rápida e o Direito, enquanto instrumento que subsidia e permeia as relações sociais, tem precisado se reinventar para acompanhar e suprir as novas dinâmicas. No Brasil, cujo sistema jurídico é tão complexo, não é difícil perceber o quão necessária se faz a implementação de novos modos de ver e pensar nessa área.

Ver e pensar são palavras caras para o design, que é uma área do saber relacionada à criação e conformação de soluções para problemas (até mesmo os não identificados). A partir desse pensamento, chegou-se à criação do termo Design Thinking(1), cuja ideia central está em aplicar a metodologia e a forma de pensar do design a outros campos, com o auxílio das novas tecnologias. E um desses campos foi o Direito.

O termo Legal Design foi cunhado pela professora Margareth Hagan, diretora do Legal Design Lab da Universidade de Stanford(2), e traduz justamente a ideia de remodelar as soluções jurídicas para que sejam mais efetivas e orientadas para pessoas, mudando o foco para a criação de respostas que agreguem valor aos indivíduos envolvidos e permitindo uma maior fluidez e acessibilidade aos conteúdos jurídicos - que, como sabemos, podem ser de difícil entendimento, gerando uma barreira para a sua implementação bem-sucedida.

O Legal Design pode ser aplicado em diversas situações, desde a disposição de um escritório para receber um cliente até a organização de palavras em uma petição endereçada ao Judiciário nos autos de um processo judicial.

Em quaisquer situações, essa metodologia tem como pilares o pensamento criativo e estratégico, voltado a facilitar a tomada de decisões e tem como principal ponto de partida a empatia, já que, ao falar de Direito, estamos invariavelmente falando de pessoas.

O Visual Law é o ramo do Legal Design que se relaciona especificamente à faceta comunicacional do Direito. Em que pese a necessidade de ser técnico para tratar de assuntos jurídicos, é certo que muitas vezes os textos se tornam enfadonhos, por ausência de um formato que facilite a visualização dos conteúdos de forma estratégica. Nesse sentido, o Visual Law preconiza a utilização de recursos visuais como gráficos, fluxogramas, imagens, formas geométricas e afins, de modo a garantir o melhor entendimento da mensagem pelo público-alvo(3).

A ideia é deixar o Direito mais acessível, claro e compreensível a partir do emprego de elementos visuais que facilitem a resolução de problemas.

Tal perspectiva se associa ao conceito de Advocacia 4.0(4), ao trazer uma ferramenta criativa para a solução de questões jurídicas complexas, revolucionando a forma de pensar.  

Observa-se que usuários finais estão se tornando cada vez mais exigentes em relação ao formato de envio da informação jurídica, o que resulta na necessidade de elaboração de Políticas de Privacidade e Proteção de Dados cada vez mais robustas(5).

Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018, a “LGPD”) a boa-fé no tratamento de dados pessoais passou a ser o principal norte de atuação das empresas. A Lei é pautada por fundamentos básicos, como transparência, sendo necessárias informações claras sobre o tratamento de dados, finalidade no tratamento de dados pessoais, adequação e livre acesso acerca do tratamento conferido aos dados pessoais. 

Sob tal aspecto, a Lei passa a incorporar certas concepções, como Privacy by Design (“PbD”). O referido conceito foi desenvolvido pela especialista em proteção de dados e privacidade, Dra. Ann Cavoukian. Tal conceito se propõe a lidar com os efeitos sistêmicos da tecnologia da informação e da utilização de dados em larga escala.

A ideia proposta é que a privacidade se torne um pilar organizacional das empresas, estando presente em todas as etapas de desenvolvimento de produtos e serviços(6). 

Para a Dra. Ann Cavoukian os objetivos do Privacy by Design consistem em garantir a privacidade, assegurar o controle pessoal das informações e gerar vantagem competitiva sustentável para as empresas. Para que isto seja alcançado, são apresentados sete princípios fundamentais, quais sejam: 

  1. ser proativo e não reativo – a ideia do PbD é antecipar e evitar eventos de violação à privacidade. Os eventos invasivos à privacidade devem ser prevenidos. Assim, não se deve esperar que os riscos sejam concretizados; 
  2. privacidade por padrão – a privacidade deve ser assegurada como padrão, não sendo necessário qualquer tipo de ação por parte do usuário para fins de proteção da sua privacidade. O PbD deve assegurar o grau máximo de privacidade, garantindo que os dados pessoais sejam protegidos de forma automática; 
  3. privacidade incorporada ao design – o PbD deve estar incorporado no design e arquitetura dos sistemas de TI e nas práticas de negócios. A privacidade deve fazer parte de todo o sistema e estrutura do produto ou serviço;
  4. funcionalidade total – para a abordagem do PbD todas as funcionalidades devem ser asseguradas de forma equânime, assegurando ampla proteção. Devem ser assegurados todos os interesses legítimos de uma maneira em que todos ganhem, não havendo o prejuízo de nenhuma funcionalidade; 
  5. segurança ponta a ponta – proteção de todo o ciclo de vida: são necessárias fortes medidas de segurança para proteção durante todo o ciclo de vida dos dados. Todos os dados devem ser coletados, retidos e descartados de forma segura;
  6. visibilidade e transparência – deve ser assegurado que o titular tenha ciência do motivo pelo qual os seus dados estão sendo coletados, quem possui acesso a estes e que o processo de coleta, armazenamento e processamento seja devidamente documentado de forma clara(7); 
  7. respeito à privacidade do usuário – os interesses dos usuários devem sempre ser visados de forma prioritária, sendo oferecidos fortes padrões de privacidade. É necessário o consentimento do usuário e que ele sempre possa ter acesso aos seus dados pessoais de forma segura(8).

Para que os interesses dos usuários sejam visados de forma prioritária, é crucial que estes tenham real conhecimento e compreensão acerca da utilização de seus dados. Para tanto, o Visual Law auxilia a implementação do Privacy by Design, ao permitir que os usuários consigam ter acesso à informação de forma mais clara e didática(9). Pela utilização de recursos visuais, por exemplo, os usuários podem ter uma melhor compreensão das Políticas de Privacidade e Proteção de Dados das empresas, garantindo a concessão consciente do consentimento e evitando futuros conflitos.

Referências

  1. BROWN, Tim. Design Thinking: uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. Alta Books, 2020.
  2. HAGAN, Margareth. Law by Design. Disponível em https://www.lawbydesign.co/. Acesso em 14 de março de 2021.
  3.  SHERWIN, Richard K.; FEIGENSON, Neal; SPIESEL, Christina. Law in the digital age: How visual communication technologies are transforming the practice, theory, and teaching of law. BuJ sCi. & TeCh. L., v. 12, p. 227, 2006.
  4. FEIGELSON, Bruno. Advocacia 4.0: sete características. Disponível em https://ab2l.org.br/advocacia-4-0-sete-caracteristicas/. Acesso em 16 de março de 2021.
  5. PINHÃO E KOIFFMAN ADVOGADOS. Legal Design: Por que o fazemos? Disponível em https://direitoparatecnologia.com.br/legal-design-por-que-o-fazemos/. Acesso em 15 de março de 2021.
  6. CAVOUKIAN, Ann. Privacy by Design: The 7 Foundational Principles. Disponível em https://www.ipc.on.ca/wp-content/uploads/resources/7foundationalprinciples.pdf. Acesso em 15 de março de 2021.
  7. DANTAS, Henrique. LGPD: O que é Privacy by Design e Privacy by Default. Disponível em https://www.advogatech.com.br/blog/@HenriqueDantas/lgpd-o-que-e-privacy-by-design-e-privacy-by-default-vc4zyjv. Acesso em 15 de março de 2021.
  8. CAVOUKIAN, Ann. Privacy by Design: The 7 Foundational Principles. Disponível em https://www.ipc.on.ca/wp-content/uploads/resources/7foundationalprinciples.pdf. Acesso em 15 de março de 2021.
  9. HAAPIO, Helena et al. Legal design patterns for privacy. In: Data Protection/LegalTech Proceedings of the 21st International Legal Informatics Symposium IRIS. 2018. p. 445-450.
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Ana Couto
Graduada em Direito pela Fundação Getúlio Vargas e pós-graduada em Direito Tributário. Co-CEO do Sem Processo. Referência na área de Legal Ops e co-criadora da CLOC Brasil.
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Larissa Bastos
Bacharel em Direito pela UFRJ. Analista de Customer Success no Sem Processo.
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